Florestas 'artificiais' podem causar mais danos que benefícios, dizem estudos
Dois estudos apontaram que o reflorestamento em larga escala e sem critérios quanto à biodiversidade da flora pode, na verdade, prejudicar o meio ambiente. O esquema de subsídios do Chile falhou em aumentar estoques de carbono e conter a perda de biodiversidade, diz estudo Robert Heilmayr/BBC Em vez de beneficiar o meio ambiente, o plantio em larga escala de árvores pode fazer justamente o contrário, segundo dois novos estudos publicados recentemente. Uma das pesquisas apontou que os incentivos financeiros para plantar árvores podem ter efeitos negativos ao reduzir a biodiversidade e geram pouco impacto nas emissões de carbono. Um outro estudo descobriu que a quantidade de carbono que as novas florestas podem absorver pode ser superestimada. A mensagem principal de ambos os trabalhos é de que plantar árvores não é uma solução simples para as mudanças climáticas. Solução de baixo custo e alto impacto? Nos últimos anos, a ideia de plantar árvores como uma solução de baixo custo e alto impacto para combater as mudanças climáticas realmente ganhou força. Estudos anteriores indicavam que as árvores têm um enorme potencial para absorver e armazenar carbono, e muitos países estabeleceram campanhas de plantio como um elemento-chave de seus planos. No Reino Unido, por exemplo, as promessas dos partidos políticos de plantar um número cada vez maior de árvores foram parte da campanha para as eleições gerais do ano passado. Nos Estados Unidos, até o presidente Donald Trump participou da campanha Trillion Trees — projeto que pretende plantar 1 trilhão de árvores. Outra grande iniciativa de plantio de árvores é chamada de Desafio de Bonn. Nele, os países estão sendo instados a restaurar 350 milhões de hectares de terras degradadas e desmatadas até 2030. Até o momento, cerca de 40 nações aderiram à ideia. Mas os cientistas pedem cautela na corrida para plantar novas florestas. Eles apontam para o fato de que, no Desafio de Bonn, quase 80% dos compromissos assumidos até o momento envolvem o plantio de monoculturas ou uma mistura limitada de árvores que produzem produtos específicos, como frutas ou borracha. Incentivos financeiros Um estudo analisou os incentivos financeiros dados aos proprietários privados para plantar árvores. Esses pagamentos são vistos como um elemento-chave para aumentar significativamente o número de árvores. A pesquisa analisou o exemplo do Chile, onde um decreto subsidiando o plantio de árvores ficou em vigor de 1974 a 2012, e foi amplamente visto como uma política de reflorestamento de influência global. A lei subsidiou 75% dos custos do plantio de novas florestas. Embora a legislação não se referisse às florestas existentes, a aplicação negligente e as limitações orçamentárias fizeram com que alguns proprietários de terras simplesmente substituíssem as florestas nativas por novas plantações de árvores mais lucrativas. O estudo constatou que o esquema de subsídios expandiu a área coberta por árvores, mas diminuiu a área de floresta nativa. Os autores apontam que, como as florestas nativas do Chile são ricas em biodiversidade e armazenam grandes quantidades de carbono, o esquema de subsídios fracassou em aumentar os estoques de carbono e conter a perda de biodiversidade. "Se as políticas para incentivar as plantações de árvores são mal projetadas ou mal aplicadas, há um alto risco de não apenas desperdiçar dinheiro público, mas também liberar mais carbono e perder a biodiversidade", disse o coautor da pesquisa Eric Lambin, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. "Esse é exatamente o oposto do objetivo dessas políticas." Absorção de carbono Um segundo estudo se propôs a examinar quanto carbono uma floresta recém-plantada seria capaz de absorver da atmosfera. Até agora, muitos cientistas calcularam a quantidade de carbono que as árvores podem retirar do ar usando uma proporção fixa. Suspeitando que essa proporção depende das condições locais, os pesquisadores analisaram o norte da China, onde houve um plantio intensivo de árvores pelo governo por causa das mudanças climáticas, mas também em um esforço para reduzir a poeira do deserto de Gobi. Os cientistas analisaram 11 mil amostras de solo retiradas de áreas florestadas, e descobriram que, em solos pobres em carbono, a adição de novas árvores aumentou a densidade do carbono orgânico. Mas, onde os solos já eram ricos em carbono, a adição de novas árvores diminuiu essa densidade. Os autores afirmam que suposições anteriores sobre quanto carbono pode ser absorvido com o plantio de novas árvores provavelmente são superestimadas. "Esperamos que as pessoas entendam que o reflorestamento envolve muitos detalhes técnicos e equilíbrios de diferentes partes, e não vai resolver todos os nossos problemas climáticos", disse Anping Chen, da Universidade Estadual do Colorado, nos Estados Unidos, e principal autor do estudo.
Notícia publicada em: G1.globo.com