Polícia Civil investiga ameaças envolvendo o patrimônio de entidade ambientalista em Presidente Epitácio


Boletim de Ocorrência foi registrado após intimidações pessoais e por meio de mensagens. Conflito entre ocupantes da área e integrantes da Apoena já é antigo. Vista geral da reserva às margens do Rio Paraná Djalma Weffort/Arquivo Pessoal A Polícia Civil instaurou inquérito para investigar ameaças que ambientalistas integrantes da Associação em Defesa do Rio Paraná, Afluentes e Mata Ciliar (Apoena) vêm sofrendo em Presidente Epitácio (SP). O ambientalista e presidente da organização, Djalma Weffort, registrou um Boletim de Ocorrência no mês passado e o procedimento teve avanço na última quinta-feira (14) após o depoimento e o indiciamento do investigado. O presidente da Apoena foi à Delegacia da Polícia Civil e declarou que possui um contrato de concessão de uso de uma área de terras em Presidente Epitácio e que há mais de 20 anos existe uma discussão com o aposentado Geraldo Lopes de Oliveira, “que reiteradas vezes tenta invadir a área de preservação ali existente”, conforme o Boletim de Ocorrência. Ainda foi relatado que em 2018 o indiciado e terceiros “invadiram novamente o imóvel e realizaram degradação da área”. Ao G1, o investigado declarou que as áreas ocupadas não pertencem ao espaço reintegrado à Apoena. “A entidade notificou a Polícia Ambiental, que autuou o autor e terceiros, com isso a entidade, junto à Justiça Federal, pleiteou a ação de reintegração de posse que, liminarmente, determinou a retirada do autor invasor. Recentemente foi prolatada sentença que manteve a medida liminar julgando procedente a reintegração”, segundo consta no documento policial. O Boletim de Ocorrência ainda indica que a área continua sob invasão e que funcionários da Apoena, principalmente o presidente, são ameaçados. “As ameaças se tornaram mais graves e nessas mensagens o autor passou a utilizar-se da imagem do tipo emoji de uma arma de fogo dizendo 'com isto na cabeça desta vez você não vai ficar impune. Vai lá na delegacia e fala isto pro delegado'”, conforme o registro. Foi relatado à Polícia Civil que o presidente e demais trabalhadores da associação “estão se sentindo acuados em relação às ameaças que também são dirigidas ao patrimônio da Apoena, que segundo autor irá queimar”. As conversas entre os envolvidos registradas no aplicativo de mensagens foram coletadas pela polícia. O celular do investigado foi apreendido para perícia. Linha de divisa da reserva aberta pelos invasores para acesso a estrada clandestina, segundo Weffort Djalma Weffort/Arquivo Pessoal Conflito antigo Conforme informou ao G1 o delegado Márcio Domingos Fiorese, há um conflito antigo entre ocupantes da área, cujo representante é o indiciado, e os integrantes da Apoena. Mas a situação chegou a um período “alarmante”, pois uma decisão da Justiça Federal, que inclusive conta com informações por georreferenciamento, concedeu reintegração total da área à Associação em Defesa do Rio Paraná, Afluentes e Mata Ciliar. “Depois dessa decisão, um dos ocupantes mandou mensagens ameaçadoras, aparentemente inconformado com a decisão judicial”, comentou o delegado. Na manhã da última quinta-feira (14), o aposentado prestou depoimento e foi indiciado pelo crime de ameaça. Na conversa com o delegado, o homem confirmou as mensagens, mas alegou que a causa ainda não foi ganha pela Apoena e que a decisão não engloba a área onde os ocupantes estão. O indiciado declarou que também recebe ameaças. Segundo o delegado, o aposentado declarou que não é “ameaça” e aparentemente questiona a decisão da Justiça Federal. Contudo, as questões de reintegração de posse e desobediência competem à esfera federal. “Chegou a um momento crítico, ficou mais iminente o perigo com a decisão desfavorável aos ocupantes”, declarou Fiorese ao G1. Após o registro, com base no artigo 147 do Código Processual Penal, que dispõe sobre o crime de ameaça, um inquérito policial foi instaurado para apurar o caso. Para contribuir nos esclarecimentos da situação, em 6 de maio foi cumprido mandado de busca e apreensão na casa do investigado, em Presidente Epitácio, ocasião na qual foi apreendido o celular utilizado para fazer as ameaças. O aparelho será periciado. Entretanto, as mensagens ameaçadoras já foram constatadas por meio do celular do presidente da Apoena. A Polícia Civil agora aguarda os resultados da perícia sobre o celular do indiciado para, na sequência, encerrar o inquérito. Também são analisados os requisitos e fundamentos sobre transação penal ou a prisão preventiva. Posteriormente às investigações, o Ministério Público Estadual analisará se caberá ou não denúncia e, por fim, a decisão da Justiça. Placa do projeto do Programa Nascentes do Governo de São Paulo paralisado em 2018 após invasões Djalma Weffort/Arquivo Pessoal Apoena A Apoena foi criada em 1988 e é apontada como uma antiga e atuante organização da sociedade civil na região do Pontal do Paranapanema com o desenvolvimento de vários projetos de conservação e recuperação ambiental. A associação também compõe a Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica (RMA), desde seu início. Conforme a RMA, a Apoena tem a concessão da área de Reserva Legal de um conjunto de quatro assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na região, a qual tem sua restauração promovida por meio de diversos projetos. “A área sofre em função de invasões para fracionamento do terreno e ocupação por ranchos de pesca. Os invasores destruíram mudas de um projeto de restauração de floresta no local em 2018, ensejando ação junto à Justiça Federal, que recentemente garantiu a retomada de posse da área. Porém, o principal responsável pelos delitos cometidos, inconformado com a decisão judicial, ainda resiste e passou a ameaçar Djalma Weffort e equipe”, conforme o documento da RMA. A Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica solicitou ao governo do Estado de São Paulo “a rápida apuração e adoção de todas as medidas legais cabíveis e necessárias, no sentido de garantir a segurança de todos os membros da equipe da Apoena, evitando-se o acréscimo de mais um caso à intolerável onda de violência contra a vida das pessoas e ao pouco que resta da Mata Atlântica”. ‘Receio’ Djalma Weffort demonstra preocupação, não só pessoal, mas também pelos 15 funcionários que trabalham diretamente na Apoena. As ameaças também causaram prejuízos, já que em 2018, após a invasão, o projeto perdeu dois financiadores que ficaram receosos. Sem recursos, a instituição não conseguiu dar continuidade ao que havia sido programado. A apreensão é de que as ameaças atuais gerem a mesma consequência e afetem a população, não só de maneira ambiental, mas também econômica, tendo que abrir mão dos funcionários, cuja maioria é chefe de família. Inclusive, o ambientalista contou ao G1 que em uma das ocasiões em que houve intimidação aos funcionários a ameça foi de que colocariam fogo nas máquinas da instituição “com quem estivesse dentro”. Conforme Weffort, nos últimos dois anos foram mais de 50 boletins de ocorrência registrados nas polícias Civil, Militar, Ambiental e Federal. A Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica emitiu uma nota solicitando uma resposta emergencial do governo do Estado de São Paulo para garantir a segurança de todos que se envolvem em ações da instituição, pois teme que a situação se torne mais grave. Um inquérito foi instaurado pela Polícia Civil, em Presidente Epitácio, e já resultou no indiciamento de um investigado pelo crime de ameaça. “Eu me sinto humilhado. Muitas vezes acho que isso pode ser uma bravata do invasor, mas a minha família cria uma preocupação maior do que a minha, porque se ele não agir por modos próprios ele pode encontrar alguém entre seus seguidores malucos para poder concretizar a ameaça”, desabafou Weffort. Ainda conforme explicou o ambientalista, quando ele cita que “pode ser um blefe” ou “uma bravata”, o indivíduo ainda está tentando intimidar os membros da associação. “Nós não vamos recuar, nós temos uma missão a ser cumprida. Temos contratos e responsabilidades, estamos amparados pela lei e não temos medo da ameaça. Vamos dar sequência ao nosso projeto”, ressaltou ao G1. Diante da tantos anos de lutas, o ambientalista tem uma esperança: “que o braço duro da lei seja aplicado, reparando uma injustiça histórica contra a sociedade e o meio ambiente!”. ‘Outra área’ Ao G1, o indiciado Geraldo Lopes de Oliveira, de 69 anos, disse que pretendem continuar no local, pois a fazenda onde residem não pertence à área reintegrada à Apoena pelo Incra. Segundo ele, o grupo reside naquela área há quase 30 anos. O aposentado relatou que houve o pedido de reintegração de posse de um contrato de concessão de uso que, segundo ele, o Incra “não deveria ter dado” a Weffort, “porque a matrícula encontra-se penhorada pela Receita Federal” em nome de um terceiro. “Quer dizer que ele não deveria ter dado esse contrato de concessão de uso em cima dessa matrícula dessa Fazenda Lagoinha", disse. "A área em que nós estamos não pertence à Fazenda Logoinha [do Incra], mas pertence a outra matrícula. Eu comprei em 1990 uma parte, é de 87 hectares. Estou lá desde 1990. Agora ele entrou com o pedido de reintegração de posse dizendo que pertence ao Incra, mas eles estão completamente errados”, declarou ao G1. Oliveira ainda contou que a sentença da Justiça Federal diz para o Incra ocupar a área invadida – na qual residem – e assumir definitivamente a posse da Fazenda Lagoinha. “Eles não estão sabendo ler a sentença. O juiz mandou o Incra assumir a Fazenda Lagoinha, ante ao reconhecimento do alegado direito a manutenção de posse pretendida, mantenho a decisão de liminar, que é o mandado de reintegração de posse do km oito e meio aos dois e meio. E ele não está entendendo”, falou. O aposentado ainda disse ao G1 que as ameaças se deram devido a um suposto “roubo” em sua propriedade e também para responder a ameaças que ele também sofreu. “Eu ameacei ele assim: se ele entrar na minha propriedade e pegar minhas coisas, quem iria cuidar dele era a Polícia Militar, que a mão de Deus é pesada, e quando eu usasse a minha grade ele iria me devolver de qualquer jeito. Aí passei uma arma de plástico no ‘zap’ [sic]: com isso na cabeça você me devolve, foi isso daí, não retiro uma palavra”, declarou. Incra Em nota ao G1, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária informou que está a par das problemáticas que há anos ocorrem naquela região. Sobre a questão das áreas, o Incra informou que atuou na condição de assistente, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), no processo aberto pela Associação em Defesa do Rio Paraná, Afluentes e Mata Ciliar, na Justiça Federal da 3ª Região – 3ª Vara de Presidente Prudente (SP). “A ação, que trata da reintegração/manutenção da posse da área em questão, teve decisão favorável à Apoena e está pendente de cumprimento judicial”, declarou ao G1 o instituto, por meio de nota. O órgão federal ainda colocou que, “por tratar-se de área destinada a reserva legal, o posicionamento do Incra é de que a mesma deve ser reservada, contribuindo para tanto a concessão de uso celebrada entre o Instituto e a Apoena, que teve como base a Norma de Execução/INCRA/Nº 33, de 14/07/2003, que visa à preservação, recuperação e conservação ambiental da área por meio de reflorestamento, combate a incêndios, manutenção das cercas, etc”. Sobre os conflitos, o G1 foi informado de que o Incra os está acompanhando e auxiliando juridicamente por meio da AGU, “haja vista que a ação mais recente foi proposta pela Apoena em face da concessão de uso celebrada entre as partes”. “O Incra informa ainda que não foi comunicado oficialmente sobre ameaças e não tem poder de Polícia para atuar nesse sentido”, finalizou. Viveiro de produção de mudas e base de trabalho do projeto Djalma Weffort/Arquivo Pessoal Placa do projeto paralisado após as invasões em 2018 Divulgação Veja mais notícias em G1 Presidente Prudente e Região.

Notícia publicada em: G1.globo.com

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